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Quatro Rs contra o consumismo, por Leonardo Boff

Aí vai um texto curto e grosso de Leonardo Boff! Porque um pouco de poesia e de contestação não fazem mal a ninguém... e é empurrão para começar a semana.

Boa leitura!


Quatro “erres” contra o consumismo
Por Leonardo Boff*

A fome é uma constante em todas as sociedades históricas. Hoje, entretanto, ela assume dimensões vergonhosas e simplesmente cruéis. Revela uma humanidade que perdeu a compaixão e a piedade. Erradicar a fome é um imperativo humanístico, ético, social e ambiental. Uma pré-condição mais imediata e possível de ser posta logo em prática é um novo padrão de consumo.

A sociedade dominante é notoriamente consumista. Dá centralidade ao consumo privado, sem auto-limite, como objetivo da própria sociedade e da vida das pessoas. Consome não apenas o necessário, o que é justificável, mas o supérfluo, o que questionavel. Esse consumismo só é possível porque as políticas econômicas que produzem os bens supérfluos são continuamente alimentadas, apoiadas e justificadas. Grande parte da produção se destina a gerar o que, na realidade, não precisamos para viver decentemente.

Como se trata do supérfluo, recorrem-se a mecanismos de propaganda, de marketing e de persuasão para induzir as pessoas a consumir e a fazê-las crer que o supérfluo é necessário e fonte secreta da felicidade.

O fundamental para este tipo de marketing é criar hábitos nos consumidores a tal ponto que se crie neles uma cultura consumista e a necessidade imperiosa de consumir. Mais e mais se suscitam necessidades artificiais e em função delas se monta a engrenagem da produção e da distribuição. As necessidades são ilimitadas, por estarem ancoradas no desejo que, por natureza, é ilimitado. Em razão disso, a produção tende a ser também ilimitada. Surge então uma sociedade, já denunciada por Marx, marcada por fetiches, albarrotada de bens supérfluos, pontilhada de shoppings, verdadeiros santuários do consumo, com altares cheios de ídolos milagreiros, mas ídolos, e, no termo, uma sociedade insatisfeita e vazia porque nada a sacia. Por isso, o consumo é crescente e nervoso, sem sabermos até quando a Terra finita aguentará essa exploração infinita de seus recursos.

Não causa espanto o fato de o Presidente Bush conclamar a população para consumir mais e mais e assim salvar a economia em crise, lógico, à custa da sustentabilidade do planeta e de seus ecossistemas. Contra isso, cabe recordar as palavras de Robert Kennedy, em 18 de março de 1968: ”Não encontraremos um ideal para a nação nem uma satisfação pessoal na mera acumulação e no mero consumo de bens materiais. O PIB não contempla a beleza de nossa poesia, nem a solidez dos valores familiares, não mede nossa argúcia, nem a nossa coragem, nem a nossa compaixão, nem a nossa devoção à pátria. Mede tudo menos aquilo que torna a vida verdadeiramente digna de ser vivida”. Três meses depois foi assassinado.

Para enfrentar o consumismo urge sermos conscientemente anti-cultura vigente. Há que se incorporar na vida cotidiana os quatro “erres” principais: reduzir os objetos de consumo, reutilizar os que já temos usado, reciclar os produtos dando-lhes outro fim e finalmente rejeitar o que é oferecido pelo marketing com fúria ou sutilmente para ser consumido.

Sem este espírito de rebeldia consequente contra todo tipo de manipulação do desejo e com a vontade de seguir outros caminhos ditados pela moderação, pela justa medida e pelo consumo responsável e solidário, corremos o risco de cairmos nas insídias do consumismo, aumentando o número de famintos e empobrecendo o planeta já devastado.

(*Publicado no site Envolverde
)

Comentários

Unknown disse…
Então, encantada por mais essas palavras de Boff, digo que quantos mais erres melhor, hem?!, contidos nas palavras e nos gestos traduzidos, para que possamos mais rapidamente nos desalienar...

Para que realmente - frente aos apelos midiáticos que chegam a ser covardes - possamos mais rapidamente Raciocinar, Refletir, Recusar e Rejeitar... Além de obviamente precisarmos urgentemente Reduzir, Reutilizar, Reciclar...

Débora, bjs no seu coração
Anônimo disse…
Querida Débora!
Embora sejamos adepatas da preservação ambiental, essa tarefa dos quatro Rs é muito difícil! Veja, na minha casa guardo tudo que é lixo seco. Evito comprar bandejinhas, lavo as latinhas, guardo as garrafas "pet", enfim, aviso aos moradores... No entanto,quando mexo no lixo normal, lá estão os lixos reaproveitáveis! Hoje mesmo,disse para a minha auxiliar aqui em casa, que irei colocá-la num curso intensivo de Educação Ambiental! Sabe é difícil, mas não podemos desistir! Bjs,
Josete
http://jmzimmer.blog.uol.com.br
Silvana Marmo disse…
Parabéns pelo seu blog...admiro as pessoas que se envolvem positivamente na era virtual.
Em seu blog li muita coisa bacana.
Tambem faço parte deste mundo virtual, faça uma visita.
http://profcoordenadorpira.blogspot.com/

Silvana Marmo

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